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28 dezembro 2017

Vermelho Sanguíneo

O desapontamento de 1 de Outubro de 1999 com The Phantom Menace teve um efeito positivo para mim, deu-me o distanciamento para  poder ver os novos filmes de Star Wars com o coração de fã, mas os olhos críticos de cinéfila. The Last Jedi reforça esse distanciamento e faz-me ver estes novos filmes disneificados de Star Wars como uma espécie de fanfiction com qualidade de Star Wars (The Force Awakens e The Last Jedi) que nem precisam de grande contextualização no universo Star Wars e, nos dias de hoje, com tudo o que se tem passado nos bastidores empresariais, considero isso uma qualidade. Há uns miminhos para os fãs da antiga, nas presenças dos "velhos amigos de então", na Millenium Falcon e no fangirling de Kylo Ren ao avô, Darth Vader, mas estes filmes destacam-se do resto e é assim que escolhi vê-los, para poder disfrutar dos mesmos sem os olhos toldados pelo purismo e preconceito de um fã.

** CUIDADO, SPOILERS! ** 

 
A primeira coisa que me chamou a atenção, logo nos trailers, em The Last Jedi foi o minimalismo estético no uso de uma paleta muito reduzida de cores (preto, branco e vermelho sanguíneo), opção nunca tomada nos filmes anteriores, com uma estética mais naturalista, mesmo que com um grande enfoque no preto e no branco. Em ambas as primeiras trilogias notava-se que havia várias mãos a criar o universo visual, mesmo que com coesão, a tendência era mostrar uma diversidade naturalista acima de tudo, principalmente nos episódios I, II e III, o que resulta nalguma salganhada visual no todo dos filmes. The Last Jedi faz o oposto, praticamente não existem mais que aquelas três cores (preto e branco não são cor, mas por uma questão prática chamo-lhes assim neste post), excepto talvez em Skellig Michael (não me lembro do nome da ilha na ficção) e no cabelo lilás de Laura Dern (Holdo). O resultado é uma sala do trono de Snoak, deslumbrante, com o vermelho polido e no planeta  Crait, com uma superfície branca de sal com rochas escarpadas pretas, que escondem um solo de cristais do mesmo vermelho sanguíneo, com um efeito ultra dramático e espantoso!
O curioso é que já tinha havido uma tentativa ténue desse formalismo em The Force Awakens, mas dessa vez com preto, branco e laranja, aliás uma das cores mais presentes em toda a saga. Mas o laranja não é dramático, principalmente nada dramático por comparação com aquele tom específico de vermelho e o tratamento polido, como do preto e do branco, a que foi sujeito. Na trilogia original as cores foram usadas de forma mais básica, branco para a luz, preto para o lado negro, na evolução de Luke, branco-cinzento-preto, e o pontuar de vermelho nos sabres dos Sith e nos Guardas Imperiais.

Mas não é apenas de forma visual que o filme é diferente, para além de John Williams ainda estar em grande forma, "aquele" minuto de silêncio durante a destruição da fortaleza da First Order, é puro génio e muito ousado para um blockbuster, especialmente se pensarmos que agora é Disney. O público da pipoca tem tendência a não aceitar estas opções, o silêncio, numa cena tão forte como essa é muito mais dramático que qualquer música. Quem faz opções destas conhece o material com que trabalha, sabe usar a linguagem cinematofgráfica. Aliás, durante The Last Jedi temos vários exemplos de uma boa realização, Rian Johnson é um nome a fixar, gostei muito do seu desempenho como realizador neste filme.

O argumento, tendo a difícil tarefa de ser o "filho do meio", também é bastante superior a The Force Awakens e surpreende na quase total ausência de previsibilidade. Este é um filme difícil de fazer spoilers. Aliás, a direcção que estes filmes tomaram, com a ausência de um verdadeiro vilão, com heróis cheios de defeitos e não tendo um único fio condutor, é sem dúvida arriscada, desviando do modelo clássico da "Jornada do Herói", de Joseph Campbell.

Mas nem tudo é fantástico neste filme, as personagens goody-two-shoes de Finn e Rose não fazem lá falta nenhuma, a informação que Finn fornece é mínima e podia vir de outra fonte qualquer, para além disso são ambos irritantes até dizer chega. Confesso que quando Finn se lançou contra o canhão, quis que morresse, e quando Rose se lança sobre Finn para o salvar, ficando ferida, também quis que morresse.  Mesmo todo o capítulo da invasão da fortaleza, mais as cenas à James Bond do casino, mesmo com Benicio Del Toro, não fazem falta nenhuma à história, excepto darem utilidade à Capitão Phasma e introduzirem as criancinhas como uma nova esperança. O uso da palavra "hope" também foi exagerado, à terceira já tinhamos percebido o leitmotiv, que pelos vistos conduz ao último filme. Parece que querem fechar o círculo.

Falando em "new hope", Carrie Fisher teve um último desempenho como Princesa Leia sólido, convincente e, sabendo o que sabemos, comovente. O Luke envelhecido, com um toque de impertinência à Yoda é engraçadíssimo, mas nota-se que Mark Hamill aprendeu muito nestes anos e tornou-se num actor seguro e consolidado. Nunca fui fã de Luke, sempre o achei muito pueril, mas neste filme sou e muito. Rey é uma aprendiz estranha, não aprende grande coisa, no fundo está lá para nos mostrar este Luke, mas por outro lado, quando age sozinha, ou contracena com Kylo Ren, regressa a personagem forte introduzida no filme anterior, mas sem sardas. Adam Driver, e mesmo o modo como a personagem de Kylo/Ben se desenvolve, é intrigante e deixa a curiosidade como será o desenlace desta história. O duelo, luta contra os ninjas vermelhos é um espectáculo, mesmo que eu permaneça fiel ao traje dos Guardas Imperiais originais. Este é terrível! Este filme tem definitivamente personagens a mais, Poe começa em grande, mas a inclusão de Rose a camartelo, dispersa a função da personagem dele, como se o condenassem a um trabalho de secretária. BB-8 está melhor que nunca, mas deu alguma pena ver R2-D2 tratado como um velho cansado, quase sem um papel activo nesta história, largado como um móvel velho, a um canto da Falcon. C3-PO também tem um papel diminuído,sem grande utilidade, mas mesmo assim com mais presença que R2.  As raposinhas de cristal são fixes e os Porgs, nunca mencionados pelo nome, não são irritantes e se forem é só fazer como o Chewie, dar-lhes um safanão.

O filme é bastante divertido, apesar de ter toda uma sequência que não faz falta e de dispersar um bocado, não o acho longo ou dificil de suportar (mas eu sou suspeita, sou conhecida por aguentar filmes de 6 horas), tem uma boa montagem, bem ritmada, e deixa curiosidade suficiente para saber como será o terceiro. E deixou-me com aquela sensação de satisfação, que nos deixa quase encandeados ao sair da sala de cinema. Depois de ver The Last Jedi, The Force Awakens, que achei um filme engraçado, mas nada de especial, melhorou aos meus olhos e percebe-se que há aqui um conceito de conjunto sólido para os três filmes.

Star Wars: The Last Jedi

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