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18 janeiro 2023

O Paquete Ideal

The Love Boat, O Barco do Amor, tem uma fórmula e uma estética. Cada episódio tem 3 histórias que se entrecruzam, uma envolvendo um elemento da tripulação, em geral comédia, um drama e uma comédia. Para além do elenco fixo, a tripulação do Pacific Princess, o elenco convidado consiste num misto de actores em início de carreira, como um Tom Hanks juvenil, ou uma Jamie Lee Curtiz adolescente, ou velhas estrelas de cinema de Hollywood, como Olivia DeHavilland, Vincent Price, Sylvia Sydney ou Joseph Cotten, em raras aparições televisivas. Pelo meio, o elenco aproximadamente entre os 30 e os 50 anos, são vedetas da TV da época, como Meredith Baxter Birney (a mãe de Quem Sai Aos Seus), ou John Ritter. Há sempre convidados musicais, portanto um número musical, e por vezes os convidados vêm em pacote, como os The Village People ou as Pointers Sisters, o que dilui ainda mais as possibilidades dramáticas do seu segmento narrativo.

Mesmo quando as histórias são sérias, o facto de serem entrecortadas pelas outras duas narrativas, torna-as bastante superficiais e previsíveis. Não que as outras não sejam previsíveis, quase todas as histórias em The Love Boat são tão previsíveis como o facto de o paquete partir de Los Angeles, parar em Mazatlan e Acapulco, e regressar a Los Angeles.

Nada disto foi surpresa, pois vi, durante os anos 80, muitos episódios de The Love Boat, mas desde que começou a dar na RTP Memória, que quis ver todos, ou quase todos, com o olhar de hoje. Sabia que iria ser bastante superficial, um tratado televisivo em como misturar décors naturais com décors em estúdio a passar por naturais, de que a piscina em trevo é o exemplo mais flagrante, e a glamourização de um estilo de vida irrealista. Mas é facil entrarmos naquele universo, acreditarmos na suspensão da descrença e deixarmo-nos ir numa viagem marítima com toques tropicais por cerca de 50 minutos. É um escapismo como outro qualquer e podemos entreter-nos com o charme, agora retro, de uma América dos anos 70 e 80 idealizados, onde acaba sempre tudo bem.

Vale pelos cenários, pelos vestidinhos muito Halston de Julie, principalmente nas primeiras temporadas, pois quando a série entra nos anos 80, passam a ser um bocado salve-se quem puder, e a moda juvenil anos 70/80 de Vicky. Há lá peças que adorava ter nos anos 80 e que ainda hoje vestiria.

Dos elementos da tripulação o meu preferido, mesmo sendo o cliché dos clichés, é o barman Isaac Washington. Os problemas dele costumam ser simples, está sempre bem-disposto e resolve quase tudo com uma bebida colorida. A seguir, apesar de exageradamente pateta, acho piada ao Gopher na sua ingenuidade. O Dr. Bricker é terrivelmente misógino e assedia o mulherio todo, uma personagem impossível nos dias de hoje. Julie é simpática e tem um sentido de humor agradável, mas quando as histórias se focam nela, em geral são exageradamente dramáticas, o que não encaixa na personalidade dela no dia-a-dia. O Capitão Stubbing é o clássico autoritário bonzinho e Vicky oscila entre a criancinha irritante e a criancinha boazinha, mas ainda irritante, por ser tão boazinha. Por fim há um ou outro convidado regular, sendo a mais recorrente a mexicana April, que é puramente um fait divers, apoiado no exagero da actriz, que provavelmente está a interpretar-se a si mesma, para quando os argumentistas têm um buraco narrativo a preencher.

Os ocasionais episódios duplos, além de terem mais de 3 histórias, costumam variar a paisagem e levam-nos a temperaturas mais frias, como ao Alasca ou ao Oceano Atlântico, mostrando com orgulho, qual postal ilustrado, o Canal do Panamá. Nesses episódios as histórias são um pouco mais profundas e incluem sempre alguma vedeta musical.

Salva-se o tema maravilhoso de Charles Fox, um dos compositores da banda sonora de um dos meus filmes preferidos, Barbarella.

The Love Boat não ambiciona ser muito mais que entretenimento leve e fica-nos, no séc.XXI, o prazer nostálgico de rever vedetas de hoje a dar os seus primeiros passos, ou vedetas do antigamente já desaparecidas.

The Love Boat (Wikipedia)

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