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08 março 2025

97 Oscars... Musicais!

 

vestido Ruby Slippers, Schiaparelli,
para a performance de Ariana Grande

Aqui está o post costumeiro dos Oscars. Este ano, dos filmes nomeados, só vi o Dune 2 e o Flow. O Flow é maravilhoso e o Oscar para Melhor Longa de Animação foi MAIS QUE MERECIDO! É refrescante ver uma longa de animação independente, que não é nem Disney nem Ghibli, da Letónia, feita praticamente por uma só pessoa, num software de 3D gratuito (o Blender), com alguns defeitos, que o próprio realizador admite, ganhar um Oscar. PARABÉNS! Acho que o Oscar para Melhores Efeitos Sonoros é merecido pelo Dune 2, do qual gostei mais dos efeitos sonoros que da parte 1, onde os achei empastelados, embora a concorrência este ano fosse quase inexistente.

Quanto à emissão portuguesa, na RTP1, este ano nem se deram ao trabalho de pagar pelo Red Carpet, do qual nunca víamos quase nada, pois o Mário Augusto falava por cima o tempo todo com os seus "selectos" convidados. Falando em Mário Augusto, lá voltou a apresentar a cena, com um convidado de quem nunca ouvi falar (mas também ando muito afastada dessas lides) e sim, houve calinadas, mas nada memorável. Este ano ele esteve estranhamente contido e quase não falou sobre a cerimónia, mas mesmo assim nunca é demais: #CalaTeMárioAugusto!

Sobre a cerimónia, Conan O'Brien, não esteve em si e a apresentação foi extremamente comedida e nem fez muitas piadas inocentes, menos ainda picantes e apenas uma política. O que é de lamentar, pois ele costuma ser genial. Houve o sketch de Adam Sandler, mas a ligação à Ucrânia não foi muito óbvia e Daryl Hannah foi a única a realmente falar da Ucrânia (aliás está com suuuper bom aspecto!). Adrien Brody e Zoë Saldaña falaram de guerras e migração e da situação actual do mundo, o Oscar para a Longa Documentário, foi para o filme israelo-palestiniano, obviamente sobre a situação em Gaza, mas nada de provocador foi dito, depois de o Mário Augusto se calar... Os elementos da equipa de Anora também agradeceram às trabalhadoras do sexo, pelo apoio ao filme.

Adorei, adorei, adorei terem voltado a incluir números musicais à séria. Uma das coisas que me chateou imenso nos anos 90, quando já era emitida a cerimónia dos Oscars completa nas TVs portuguesas e ainda no tempo do Billy Crystal, foi quando houve cortes, digamos orçamentais, e a cerimónia passou de 4 a 5 horas a 3, e os números musicais foram reduzidos ao número de abertura e às canções nomeadas, sem o aparato de então. Tenho reparado que tem havido algum reinvestimento nos números musicais nos Oscars, principalmente depois da pandemia, mas este ano foram verdadeiramente interessantes. Infelizmente isso foi, provavelmente para não aumentar a duração da cerimónia, em demérito das canções nomeadas, que este ano não foram apresentadas em palco. Dos números musicais, adorei o do James Bond e o do Quincy Jones. Também houve o obrigatório número do Wicked, caía o Carmo e a Trindade de Hollywood se não houvesse um número do Wicked, gostei do vestido Ruby Slippers, por Schiaparelli, de Ariana Grande (imagem acima - sem Ariana), mas o Wicked não me diz nada, não fui nem quero ver, pois não gosto de musicais modernos e estou farta de origin stories.

Também gostei de, nos bastidores, Adrien Brody e Halle Berry repetirem o beijo de quando ele ganhou o seu Oscar anterior. Fofinho.

Agora ao que realmente interessa, os trapos. Começando com os homens, foi bom ver muito mais cor neles, mas a maioria usou um tom de diarreia (ou xixi - Chalamet, estou a apontar para ti!), que os favorece muito pouco. Voltem a usar veludo em tons de pedras preciosas, que é sempre um regalo para os olhos. Nem sequer houve um Billy Porter ou assim, com uma fatiota OTTP, para podermos comentar.

Isabella Rosselini

As meninas foram muito old Hollywood, mas pelo meio houve algumas peças interessantes. Halle Berry foi vestida de bola de espelhos, mas eu gosto de bolas de espelhos. Felicity Jones e Whoopy Goldberg levaram ambas vestidos "água líquida", o de Goldberg, fabuloso, desenhado por Christian Siriano. Depois uma série de meninas levaram uns vestidos diferentes, de destacar os method dressing de Ariana Grande e Cynthia Erivo, o de Ariana Grande, quentinho, acabado de sair das passarelas de Schiaparelli. Mas o meu maior destaque foi para Isabella Rossellini em Veludo Azul (e estava sentada ao lado de Laura Dern). Pena destacar-se a morte de Gene Hackman, mas nada sobre o Lynch, fora o slide, e esqueceram-se da coitadinha da Michelle Trachtenberg, que morreu um dia antes do Hackman (Lex Luthor para sempre!), no in memoriam.

Cynthia Erivo, Ariana Grande, Whoopy Goldberg, Raffey Cassidy e Storm Reid

Os exemplos acima são alguns dos quais gostei, mas havia mais uns quantos, não queria uma imagem demasiado grande para por aqui.

Gostava de partilhar aqui os dois números musicais, mas são só para olhos norte americanos e não estou com paciência para ir procurá-los na candonga.

Oscar.com

18 janeiro 2025


Se não me falha a memória, o primeiro filme que vi de David Lynch foi o maravilhoso The Elephant Man, na televisão. Já conhecia a história de John Merrick, tendo sido criada por uma anglófila, mas na altura todo o conjunto do filme impressionou-me do mesmo modo que a história original já impressionava. Entretanto já o vi num cinema, o único sítio onde determinados filmes devem ser vistos, e só posso dizer que é um filme sublime.

Em 1984 eu vivia fora de Portugal, num local com difícil acesso a determinados filmes, andava sedenta de ficção científica, e a primeira coisa que fiz, quando regressei a Portugal, no Verão de 1985, foi enfiar-me numa sala de cinema e ver o Dune, o meu primeiro Lynch num cinema. Adoro o Dune até hoje, adoro tudo o que introduziu na ficção científica, a ficar estagnada num universo quase ascético, criado pela minha amada série Space: 1999, e perpetuada pelo universo de Star Wars. Já o revi várias vezes, seja no cinema ou na TV, e continuo a encontrar-lhe coisas novas.

Avançando uns anos, no final dos anos 80, andava desejosa de ver o Eraserhead, do qual apenas conhecia a famosa foto do cartaz e que tinha sido o primeiro filme de David Lynch, aquele tipo do Dune. Só o vi, bastantes anos depois, acho que numa sessão no Cinema King.

No meu primeiro ano da Escola de Cinema, começaram a surgir notícias acerca do episódio piloto de Twin Peaks, uma série criada por Lynch, em desenvolvimento. Um colega tinha esse episódio numa VHS oficial, que tentámos ver na Escola (tínhamos leitores de VHS em quase todas as salas), mas não conseguimos um leitor disponível durante o tempo de duração do episódio e basicamente só vi a primeira cena, da Laura Palmer a ser encontrada na praia, embrulhada em plástico translúcido, ao som de Badalamenti. Felizmente não demorou até que a série estreasse em Portugal, que vi o mais assiduamente que me foi possível, numa época de gravadores VHS que não eram programáveis e nada de boxes de TV ou serviços de streaming. Nunca vi o final da série, fui perdendo vários episódios seguidos e, com a intriga a ficar cada vez mais embrulhada, perdi o fio à meada e o interesse. Cansei-me. Mas vi o Fire Walk With Me, que nos deu um bocadinho mais de Laura Palmer que a série, mas não cheguei a ver a nova série.

Blue Velvet teve mais ou menos o impacto inicial em mim que teve Twin Peaks, aquela middle America suburbana, que esconde um lado muito sombrio e sórdido. Ah, o Dennis Hopper...

Vi Wild at Heart no Cinema Londres e saí da sala furiosa. Detestei. Passado algum tempo, umas semanas, pensei para mim própria que para ter tido uma reacção tão violenta, é porque o filme não pode ser mau e merece ser revisto. Revi-o depois do último dia de aulas da Escola de Cinema, numas sessões de cinema drive-in das Festas de Lisboa, na Bica do Sapato, e obviamente adorei revê-lo. Acho que o Wild at Heart é, a par com o Dune, sorry Mr. Lynch, o meu preferido de David Lynch.

Fui continuando a ver os filmes dele, Lost Highway uma trip, Mulholland Drive uma alegoria muito Lynchiana de Hollywood (que vi mais ou menos na mesma altura em que li Coldheart Canyon, de Clive Barker, que à sua maneira, trata da mesma zona de LA e da mesma temática), mas, continuando a adorar os filmes, nunca mais tiveram o mesmo impacto.

Por circunstâncias da vida, nunca cheguei a ver a maioria dos últimos filmes dele, A Simple Story e Inland Empire entre eles, mas é uma falha a ser colmatada. Uma das razões porque não vi Inland Empire, foi porque andava com muito pouca disponibilidade quando o filme estreou e, quando dei por ela, tinha saído de cartaz.

Sigo o Lynch pelas redes sociais desde que comecei a usá-las, tive um momento WTF quando o que ele publicava eram basicamente os vídeos da meditação transcendental (absolutamente nada contra e aprendi umas coisas com isso), ou as suas pinturas, e Lynch continuava ali, a viver naquele cantinho das coisas que gosto, mas sem lhe prestar muita atenção. Foi agora, com a morte de David Lynch, a ver a gigantesca quantidade de fotos dele online, de posts de apreciação e homenagem, que percebi que Lynch teve um impacto muitíssimo maior na minha vida do que eu pensava.

A última coisa que vi dele/com ele, foi a sua interpretação de John Ford em The Fabelmans, de Spielberg, que vi há menos de um ano, na TV. Participação da qual não fazia ideia e me surpreendeu imenso, principalmente porque ali, ao ver essa cena, parecia que o real Lynch terá sido um desdobramento do Ford, no modo como falava com as pessoas, de modo provocatório e directo. Foi muito bem apanhado, Sr. Spielberg!

11 março 2024

96 Oscars... "Cala-te Mário Augusto!"

Este ano não tenho foto. Apesar de haver vestidos exóticos ou chamativos na Passadeira Vermelha, nenhum me cativou por aí além. Menção honrosa para Carey Mulligan e Anya Taylor-Joy, pelos vestidos clássicos "diorescos" (o da Anya era mesmo Dior, o da Carey não sei.

Este ano, para variar, vi 4 dos filmes nomeados, o que é uma grande diferença para anos anteriores em que, em média, não tinha visto nenhum. Esses filmes foram, por ordem de visionamento, Barbie, Napoleon, The Boy and the Heron e Poor Things. Pelo que estava com boas expectativas para a cerimónia. 

O problema está nas TVs portuguesas, que é rara a vez em que não tem uns idiotas a fazer comentários desajustados em cima da cerimónia. A excepção vai para a SIC, que colocou os idiotas no canal generalista, enquanto transmitia em simultâneo a cerimónia na SIC Caras, limpa de idiotices. Foram as únicas vezes em que fomos poupados! Nessa época pudemos inclusive ver os Golden Globes, que infelizmente não regressaram aos canais nacionais. 

Mário Augusto prometeu não falar em cima da cerimónia e não cumpriu! Para variar, continua a falar um inglês deplorável, continua a não saber a nomenclatura correcta das diversas funções no cinema em português e demonstrou mais uma vez a sua ignorância em relação a todo o cinema que foge um bocadinho ao mainstream e uma aberrante falta de respeito pelos nomeados/premiados: 

  • menosprezou Godzilla Minus One e o seu prémio pelos melhores efeitos especiais, falando por cima dos discursos de aceitação e ainda por cima reduzindo o filme a não merecedor (todos sabemos que a ficção científica não é cinema a sério, né?);
  • falou por cima da canção Whazhazhe, de Killers of the Flower Moon (racista!)
  • chamou "edição" à montagem e "editora" à montadora Jennifer Lame, de Oppenheimer, para além de falar por cima do discurso dela;
  • mandou uma série de bitaites desinteressantes por cima da canção vencedora inteirinha, What was I Made For?, de Billy Eilish e Finneas O'Connell;
  • não se calou nos discursos de Melhor Filme, principalmente o de Emma Thomas, a produtora (misógino!);
  • não deixou ouvir muitos outros discursos vencedores, principalmente nos filmes ou categorias que não entram no seu gosto pessoal, básico e extremamente limitado. Ah! E claramente não viu quase nenhum dos filmes. 
Tenho a certeza que a lista de ofensas continua, mas preferi não apontar. No 'drinking game' virtual que fiz no feicebuque, bebi 14 martinis 🍸, acho que isto é dizer muito! Mais valia, RTP,  não porem lá ninguém! 

Isto tornou uma das melhores cerimónias dos Oscars dos ultimos anos no programa mais irritante possível! Se eu o apanhasse à minha frente, dava-lhe um chapadão na cara!  CALA-TE!

Pequena nota positiva para o discurso atrapalhado mas emocional de Emma Stone, o prémio para o qual eu estava a torcer mais, incluindo o fecho do vestido a rebentar na cintura. Outra para o número da canção I'm Just Ken, directamente inspirado no segmento Diamonds Are a Girl's Best Friends, de Some Like it Hot (com Marilyn Monroe), que incluiu os Kens, incluindo o Doctor Ncuti Gatwa, John Cena a apresentar o Oscar para melhor Guarda Roupa apenas com o envelope e depois um lençol e, por fim, o único discurso que mencionou a guerra na Palestina, apesar dos pins de cessar-fogo, de Jonathan Glazer, realizador de The Zone of Interest (Melhor Filme Internacional) ao comparar o seu filme à situação na Faixa de Gaza.

E este ano um dos filmes vencedores, The Boy and the Heron, Melhor Longa de Animação, foi traduzido por mim, para português! Já posso pôr no currículo! 

18 fevereiro 2024

Inglesa Falsificada

Nunca liguei muito aos filmes da Bridget Jones, tanto que na altura não os vi no cinema, só os vi depois, num "sábado à tarde de ressaca", 1na TV. São engraçadinhos, mas, fora o Colin Firth a fazer um spoof do seu mítico Mr. Darcy, são filmes para ver uma vez e pronto.

Mas não é disso que quero falar aqui. Este mês, por causa do dia de São Valentim, o agora STAR Life anda a passar uma série de filmes de cordel, que se tornaram numa boa maneira de eu adormecer... durante o dia às vezes tenho deixado a TV ligada no canal como ruído de fundo, enquanto faço outras coisas, pois não exigem a minha atenção.  Os filmes de Bridget Jones (os dois) fazem parte da ementa deste ano, pelo que os tenho "ouvido". Não vou mencionar como os filmes envelheceram mal, envelheceram!, mas de uma coisa que me irrita bastante: a inglesa falsificada de Renée Zellweger.

À semelhança dos filmes, Renée Zellweger nunca me impressionou grande coisa como actriz, mas também a maioria dos filmes que fez não são propriamente a minha praia. Em Bridget Jones, pode ter a carinha laroca, é engraçada e um desempenho razoável, mas o sotaque britânico mais que forçado estraga tudo. Lembra os brasileiros quando querem fazer sotaque de Portugal, que incluem uma série de maneirismos, como "pois, pois" e basicamente estragam tudo. Zellweger faz uma espécie de sotaque Britânico médio que não existe, que a faz soar super forçada. 

Renée Zellweger não consegue fazer um sotaque britânico convincente, não para mim. Para além disso, está sempre a sussurrar e articula imenso cada palavra, o que acrescenta à irritação do seu sotaque falsificado. Acho tão estranho numa produção com dinheiro, com um bom elenco de actores britânicos, não tenha havido alguém para lhe ensinar um sotaque britânico como deve ser, fosse um Cockney londrino cerrado ou um Queen's English, qualquer um seria melhor que aquele pastiche. Será que os britânicos foram convencidos? Só me lembro de se falar de ser uma actriz americana a fazer a muito British Bridget, mas não me lembro de comentários acerca do sotaque. Lendo a Wikipedia, percebo que os americanos até ficaram convencidos, foi nomeada para Melhor Actriz nos Oscars, mas devo ter um ouvido demasiado apurado, que a mim não me convence.

Fora ser uma comédia romântica, um género sempre popular, continuo sem perceber o hype à volta de Bridget Jones. Pretty Woman, que também passa regularmente no STAR Life, sobreviveu muito melhor à passagem do tempo. Talvez porque se foque em arquétipos em vez de piadas secas e uma narrativa básica, como Bridget Jones. Não sendo fã nem de uma, nem da outra, Julia Roberts também é muito melhor actriz e arrasa em Pretty Woman.

Bridget Jones Diary

14 janeiro 2024

*mar de visco maléfico

No episódio Matter of Balance, de Space: 1999, Maya explica a Koenig as figuras que filmou na estrutura do planeta Sunim como vindas de um mar de visco maléfico. Seria realmente maléfico se não fosse um sea of primeval slime, portanto, um mar de visco primordial.

É caso para dizer que um reforço no inglês de quem traduziu este episódio é primordial!

primeval

primordial

maléfico

New York, New York!

Apesar de ser fã incondicional do seu trabalho, só soube quem foi Roy Halston quando, por volta da altura da sua morte, comecei a entrar no mundo de Andy Warhol e da sua Factory. Percebi que Halston fazia parte do grupo do Studio 54 (ai, quem me dera ter sido uma mosquinha e estar no Studio 54 enquanto aquilo bombava!), portanto, festas, glamour, e muitas drogas recreativas. Foi também nessa altura que comecei a perceber que estava ali uma pessoa com uma história que tinha pano para mangas.

Halston, a curta série da Netflix, conseguiu preencher bem esse contar da historia da personagem Halston. Naturalmente, como todas as séries ou filmes biográficos, nem sempre se dedicam a contar os factos reais,  mas frequentemente tomam atalhos ou reinventam acontecimentos, de modo a melhor encaixar numa narrativa coesa. Quando isso é bem feito, uma pessoa até pode sentir alguma curiosidade em saber os factos reais, mas não sente falta de o saber para melhor disfrutar desse episódio ou filme.

Nisto a série Halston acerta na mouche e quero lá saber dos factos reais! O que vi no ecrã é dinâmico, verosímil, empolgante, visualmente interessante e muito bem acompanhado por uma selecção musical. 

A recriação dos espaços, principalmente o "atelier" de Halston, com as janelas panorâmicas, mobília minimalista e alcatifa vermelha, ou o seu apartamento, também minimalista, mas em branco e preto, com cortinas do tecto de pé direito duplo até ao chão, são impressionantes e um espanto. Tanto quanto dá para perceber pelos registos existentes, também estão impecavelmente reproduzidos.

O mesmo posso dizer dos figurinos de Halston, os vestidos de seda esvoaçantes, em viés, as sua marca registada e o que realmente o fez um génio do design de moda,  não o "ultrasuede", que sendo vanguardista, foi a base para financiar a criatividade livre desses vestidos drapeados. Li no imdb que a figurinista da série se esforçou para fazer réplicas fidedignas, mesmo que por vezes, por questões técnicas, tivesse de fazer alguns desvios criativos. Excelente trabalho! Recriar figurinos de épocas mais recentes, que ainda estão na memória colectiva e facilmente podem ser acedidos em museus ou registos fotográficos, às vezes é o mais difícil, pois a margem de erro e criatividade é bem mais limitada. O desafio é ainda maior quando o que se está a recriar foi concebido por um génio único.

O mesmo tipo de abordagem foi feito no modo como foi contada a história de Halston. Os flashbacks à infância foram mantidos num mínimo, uma espécie de memória onírica, um Rosebud wellesiano, com um grande foco em mostrar o estilo de vida único daquelas pessoas, fora do alcance do comum mortal. Mesmo antes de fazer fortuna, Halston comportava-se como um milionário e fê-lo até morrer. Aliás, essa riqueza aparente é um dos pontos-chave desta história, já que no fim da vida vendeu o seu nome para poder manter o estilo de vida.

Estilo de vida que passou de um pudor para com as drogas, para um consumo desbragado de coca, orgias de sexo e festas atrás de festas, incluindo ser cliente habitual do Studio 54. Falando em Studio 54 e em recriações, depois de ver alguns documentários acerca da discoteca, fotografias das festas e afins e ler sobre esse breve local cintilante de Nova Iorque, mesmo no limite do início da decadência da vida mais-que-boémia daquela cidade, a recriação do ambiente, mostrando personagens notórias que o feequentaram regularmente, Warhol, Divine, Bianca Jagger montada no cavalo branco na festa do seu aniversário, o sexo sem pudor na varanda, a nudez, o suor, a música, foram a melhor recriação que já vi de um lugar onde gostaria de ter estado pelo menos uma vez, por uns minutos que fosse. A isso tenho de agradecer aos criadores da série, pois consegui sentir-me lá dentro por uns segundos. A propósito, o actor que faz de Steve Rubell, um dos sócios da discoteca, estava igualzinho, incluindo a diferença de altura em relação a Halston. Rubell um judeu baixinho, Halston um homem alto. A atenção ao pormenor é impecável em todos os aspectos.

Também gosto do modo como o guarda-roupa de Halston acompanha dramaticamente a personagem, sempre impecavelmente vestido e sempre com as suas gabardinas com grandes golas levantadas, começa vestido de roupa mais ou menos banal, colorida, a gabardina em pele castanha, passa para o preto da cabeça aos pés, golas altas, óculos escuros, gabardina preta em pele ou tecido de gabardina, quando Halston se tenta impor no mundo da moda. A gabardina passa a ser ocasionalmente branca, em tecido de gabardina, quando se estabelece, oscilando entre o preto e o branco por um período relativamente longo. A gabardina passa a vermelho no início da decadência e quando fica doente volta ao preto e branco, à gabardina em pele, passando gradualmente para o branco da cabeça aos pés e trocando a gabardina por uma camisola de torcidos (branca) no período da "reforma".

Nem todos os actores são fisicamente muito decalcados dos originais, a começar por Ewan McGregor, mas a caracterização física, o guarda-roupa, maquilhagem e cabelos, determinados pormenores, fazem-nos ser convincentes, e tornam-nos reais.

Como já dei a entender, a mise-en-scéne da série é maravilhosa e mostra muito bem as personalidades e acontecimentos fora do alcance do comum mortal, com muita simetria, movimentos de câmara amplos, filmando Halston com frequência em contrapicado, o que o torna mais alto e trabalha a personagem como se fosse um monumento, um semideus. Mesmo nos momentos mais baixos, de um Halston deprimido, a câmara raramente sobe além do nível do olhar, tratando-o sempre como alguém maior que o mundo.

Mas é o desempenho de Ewan McGregor que arrasa com tudo o resto! Sou fã dele há muito tempo, antes de Trainspotting. Vi-o pela primeira vez na série musical de Dennis Potter, Lipstick on My Collar, e já nessa altura fiquei muito impressionada, e acho que McGregor é um actor muito completo. Todos os desempenhos que vi dele ("Hello there!") nunca decepcionam e mostram o seu registo alargado. Como Halston ele domina completamente a cena, como provavelmente o próprio Halston fazia. Não se consegue desviar os olhos do ecrã. 

Como se não bastasse, a escolha de elenco e os excelentes desempenhos nao se ficam por aqui, destaco Krysta Rodriguez, maravilhosa como Liza Minelli. Além da semelhança física, Rodriguez soube capturar maravilhosamente bem a personalidade e maneirismos de Liza, até a voz está parecida. Rebecca Dayan, como Elsa Pereti, também se destaca no elenco principal e Bill Pullman foi a escolha certa para o empresário David Mahoney. Aliás, não há um único actor que se destaque no mau sentido, não há um unico mau desempenho. Foi divertido ver a personagem (real) de Joel Schumacher aparecer na série. Li algures recentemente, provavelmente quando a série saiu, que tinha sido assistente de Halston. 

Por fim, a banda sonora não desaponta, tratando-se de uma compilação de vários temas musicais, que não se reduz ao contemporâneo da época ou ao disco, misturando temas mais modernos para um efeito dramático que funciona mesmo bem.

Na recriação impecável dos anos 60 a 80, daquela faixa social muito específica, de uma Nova Iorque em ebulição, com desempenhos poderosos, uma realização firme e emocionante, uma produção coesa e equilibrada, Halston é das melhores séries modernas que já vi. Uma surpresa muito boa, pois apenas me interessei pela série porque o tema me interessa e pela curiosidade em ver Ewan McGregor a interpretar uma personagem tão diferente.

Halston

06 janeiro 2024

O Animal é o Maior!

 

Desde que vi Os Marretas pela primeira vez, nos idos anos 70, que o Animal é a minha personagem preferida. Lembro-me de, na minha primeira viagem a Londres, ficar louca com a secção de brinquedos do Selfridge's (já não tem) e de trazer de lá alguns Marretas nuns kits em tecido tipo feltro para montar. Lembro-me de ter o Kermit, a Piggy, o Rowlf (eu e os músicos) e o Animal. Sempre adorei bateristas, e o Animal é o maior. Adoro como ele está sempre na dele e da sua honestidade selvagem, sem filtros. Sou tão fã que a mala que mais tenho usado no dia-a-dia tem o Animal estampado. 

Quando foi anunciada a série da Disney+ dedicada à banda Dr. Teeth & The Electric Mayhem, é claro que fiquei entusiasmada. Mas a dificuldade em por-me a ver séries no PC fez com que adiasse ver a série e a tenha visto com algumas, poucas, interrupções. Isso está a mudar, e conto continuar a ver séries alternadamente entre o que passa na TV e o que arranjo para ver no PC.

A série é curtinha e tem uma permissa simples: Norah, que trabalha numa editora decadente, Wax Town Records, compromete-se a fazer cumprir um contrato há muito firmado com os Electric Mayhem para gravarem um álbum, de modo a salvar o seu emprego e a editora. Todas as personagens, excepto os Electric Mayhem, Penny Waxman (a dona da editora) e os respectivos parentes, são interpretadas por pessoas, o que lhes dá aquele ambiente clássico do The Muppet Show, mas de modo mais ou menos invertido, onde os Muppets são a excepção. Norah é certinha e organizada e tem dificuldade em lidar com o caos que são os Mayhem. Como apoiantes tem a irmã Hannah e o groupie e técnico da banda, Moog. O antagonista é o yuppie ex-namorado de Norah, JJ, que quer comprar a editora por tostões, portanto boicota constantemente os esforços de Norah. 

Em cada episódio vemos Norah a enfrentar algum obstáculo que impede a concretização da gravação do álbum e um concerto no Hollywood Bowl, a maioria sendo incompatibilidades com a banda. Pelo meio, temos algumas origin stories, nomeadamente de Dr. Teeth ou do Animal, mas que não fazem falta alguma. Os sketches, como o Animal à procura de emprego, o quadro recorrente do Zoot a tirar Polaroids, ou a incompreensão do que Lips diz, são quase todos excelentes e aproveitam bem o star power do Animal, mas a linha condutora da série é fraca e prende muito pouco. Ficam os convidados notórios nalguns episódios, o colorido e exotismo da banda e pouco mais. Norah, Hannah e Moog têm pouca dimensão apesar da história de redenção de Norah, que na realidade a torna numa personagem em geral pouco agradável. O melhor mesmo é a música e a canção do genérico é alegre e muito orelhuda.


Ah sim e, como eu sempre soube, o Animal é um fashion icon! Belas camisas, Animal! 🤟

The Muppets Mayhem

13 agosto 2023

De Regresso a Alpha

Y1 - Guardian of Piri

Há uns meses a SIC Radical (há que tempos que não via a SIC Radical!) repôs o Espaço: 1999 e apesar de ter a série em DVD, de já a ter visto dúzias de vezes, resolvi revê-la pois estou sem leitor de DVD.

Mas a SIC Radical não tem respeito nenhum pela série. Para começar, resolveram adquirir a versão, acho que dos BluRay, com o formato 16:9. Acontece que Space: 1999 foi filmada no formato 3:4 e tirar-lhe duas fatias de imagem, em cima e em baixo, faz com que, por exemplo, parte do título "Space: 1999" fique cortada. Numa série com uma direcção de câmara exemplar (já lá vou), isto é um crime.

Outro "pecado" da SIC Radical, apenas o primeiro episódio foi transmitido na ordem certa, o resto é aleatório e, pior, repetem episódios! É verdade que em Space: 1999 não há grande continuidade, mas o episódio Earthbound (com Christopher Lee) onde o comissário Simmons mói o juízo a toda a Base Lunar Alpha para ser ele o escolhido a regressar à Terra com os Kaldorians, não pode ser transmitido muito depois de Breakaway, por uma questão de lógica. Já revi uns 11 episódios, incluindo o episódio Matter of Life and Death duas vezes, e nada de Earthbound...

Por último há o meu pet peeve de na tradução estarem "as" Águias, em vez de "os" Águias. É um pormenor e a tradução actual está mais correcta em termos da língua portuguesa, mas para quem cresceu a ver a série com a designação "os Águias", faz imensa confusão. 

O lado absolutamente positivo é rever a minha série preferida e mesmo assim reparar em coisas novas, como os magníficos movimentos de câmara. Muito já falei e se fala da qualidade e inovação dos efeitos especiais práticos de Space: 1999, muito já se falou dos cenários espantosos e excelente fotografia, ou mesmo dos argumentos (da primeira temporada) a raiar o terror e com uma carga às vezes muito pesada. Mas é raro falar-se do trabalho e posicionamento de câmara e agora foi a primeira vez que reparei nestes movimentos de câmara subtis mas invulgares, com panorâmicas aliadas a aproximações de câmara, movimentos a acompanhar os actores, que dão um dinamismo visual à série incrível. Seria de esperar, com a austeridade dos cenários e guarda roupa, que a câmara fosse rígida fora das cenas de acção, mas em vez disso temos uma câmara fluída, principalmente quando acompanha os actores em momentos dramáticos. Será a herança de uma direcção de câmara mais vanguardista dos anos 60, mas que realmente enriquece e suaviza a restante austeridade visual. Gostava que houvesse esse tipo de direcção de câmara actualmente, ou que houvesse maior variedade e arrojo na direcção de câmara. Actualmente é tudo muito igual e de modo a não se dar por isso. É uma estética, clássica, mas numa série de ficção científica, por exemplo, há alguma margem para a mise-en-scéne não se ficar pelo básico. Acho que, das séries modernas com algum arrojo visual que vi neste século, só mesmo Legion foi mais além.

Catacombs of the Moon

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